quarta-feira, 17 de outubro de 2018

"Semana perdida", por Merval Pereira

Foi uma semana perdida para o candidato petista Fernando Haddad. Agora só restam duas até o segundo turno,  e nada indica que tenha encontrado o caminho certo para tentar tirar votos de Bolsonaro, que continua com 18 pontos à frente desde que encerrou o primeiro turno na liderança da corrida presidencial, como mostra a mais recente pesquisa de intenção de votos divulgada ontem pelo Ibope

Combater Bolsonaro com um discurso genérico sobre valores e democracia, vindo de quem vem, e emitido aos eleitores antipetistas que votaram nele, é pura perda de tempo. O PT não entendeu que a votação de Bolsonaro se deve  ao antipetismo disseminado pelo país, mas sobretudo à insegurança da população, ao conservadorismo do brasileiro médio, considerado um defeito pela esquerda.

 Não que veja na provável vitória de Bolsonaro uma resposta adequada a esses conflitos da modernidade, e, sobretudo, considero perigosa a postura de que a maioria tem que se impor às minorias, impedindo que tenham espaço na sociedade.

Bolsonaro aos poucos vem recuando de posições radicais que defendeu, assim como o PT tenta ir para o centro, ambos sem muita convicção. Sobretudo, o que Haddad diz não se escreve, porque o escrito que vale é o de Lula, não dele.

Não estou convencido de que os dois estejam sendo sinceros, pode ser apenas recuo de estratégia eleitoral. Mas as instituições nacionais saberão cobrar-lhes um comportamento dentro dos marcos da democracia. A grande maioria dos que votaram em Bolsonaro não mudará seu voto, assim como os adeptos do petista também não o farão. A margem de mudança é muito pequena, como mostra a pesquisa Ibope: Bolsonaro é o que tem mais simpatizantes convictos: 41% votariam nele com certeza, e 35% não votariam de jeito nenhum. Haddad é o que tem a maior rejeição: 47% não o escolheriam em nenhuma hipótese, e 28% manifestam certeza na escolha.

 A ideia de formar uma aliança pluripartidária “a favor da democracia” não sensibilizou seus supostos componentes, não porque sejam favoráveis a Bolsonaro. Ao contrário, não são. Mas a alternativa de apoiar o PT, que representaria a “civilidade” contra a “barbárie”, não está conectada com a realidade da atuação política dos petistas, nem com a relação que mantém com seus adversários, que sempre foram tratados como inimigos a serem destruídos.

Ciro Gomes, do PDT, foi o mais atingido por essa postura egocêntrica do PT, pois estava claro desde o inicio da campanha que era quem tinha mais condições de se contrapor a Bolsonaro, pelo estilo agressivo que essa disputa exigia, sem entrar no mérito e nas razões que levaram a essa situação.

O ex-presidente Lula, por cálculo personalista, para não perder a liderança da esquerda, barrou de todas as maneiras a aliança com o PDT. Inclusive ameaçando o PSB de lançar candidato em Pernambuco se apoiasse Ciro. Agora, que Inês aparentemente é morta, surgem dentro do PT sugestões de anunciar que em 2022 o candidato será Ciro Gomes.

  O PSDB, embora tenha perdido muito de sua importância na representação parlamentar, tem a chance de se reinventar se souber se colocar na oposição de maneira clara, fazendo o mea culpa proposto pelo senador Tasso Jereissati e se desgarrando de suas lideranças apanhadas na Operação Lava Jato. Além do fato de que o partido e seu principal líder, Fernando Henrique Cardoso foram achincalhados pelo PT durante os 13 anos em que estiveram no poder.

 Marina Silva não tem razão para acreditar que o PT aceitaria seu programa sobre meio-ambiente, já que saiu do governo justamente por discordâncias fundamentais. Além do mais, esse tipo de acordo pode ser rompido a qualquer momento, e Ciro já disse que a natureza do PT é a do escorpião, que ferroa quem o ajudou a atravessar o rio, mesmo que morra junto.

Em política, nunca diga nunca. Mas a dificuldade de fazer um amplo acordo está demonstrada, por exemplo, no simulacro de autocrítica que Haddad fez. Na impossibilidade de admitir que seu partido se utilizou da máquina do Estado brasileiro amealhando dinheiro para financiar as campanhas eleitorais com o objetivo de se perpetuar no poder, saiu-se com uma explicação ridícula de que as estatais ficaram sem controle. Ora, quem controlava as estatais era o Palácio do Planalto, que distribuiu para o PT e seus aliados nacos da riqueza do país.  Não houve falta de controle, mas controle excessivo do governo, liderado pelo ex-presidente Lula, como se a Petrobras e outras estatais existissem para financiar a máquina petista. E encher o bolso de seus líderes e aliados.

O Globo