domingo, 21 de outubro de 2018

"2013, a nova onda", por Ascânio Seleme

Para quem imaginava que as jornadas de 2013

estavam encerradas, 2018 mostra que o que 

houve foi uma pausa


Para quem imaginava que as jornadas de 2013 estavam encerradas, 2018 mostra que o que houve foi uma pausa. A mesma motivação que levou centenas de milhares de pessoas às ruas em todo o país naquele famoso mês de junho subverteu quase todos os prognósticos eleitorais deste ano. Os que supunham que aquele foi um movimento de esquerda também quebraram a cara.
Mais do que o evidente antipetismo que se espalha entre todos os segmentos da sociedade, uma revolta aguda contra o sistema político consolidou a extraordinária votação de Jair Bolsonaro e trouxe para a liderança na corrida sucessória nos estados pessoas absolutamente desconhecidas como Wilson Witzel, no Rio, Romeu Zema, em Minas, e Ibaneis Rocha, no Distrito Federal. O barulho que está se ouvindo hoje ecoa há cinco anos.
O mesmo grito contra “isso tudo” das jornadas de junho emergiu das urnas no dia 7 de outubro e se escuta nas pesquisas eleitorais para o segundo turno. Nenhuma dúvida de que o voto em Bolsonaro representa o mais agudo protesto pelos anos de escândalos que envolvem todos os partidos políticos. E, pior, pela falta de consequência prática, com a honrosa exceção da Lava-Jato.
O PT cometeu o mensalão e seguiu sendo eleito e governando. Mais adiante atentou com o Petrolão e seguiu no poder até o impeachment de Dilma, que se deu por outra falcatrua, as pedaladas fiscais que maquiaram a economia e possibilitaram a sua reeleição. Mas aí vieram Temer e o MDB. Já o PSDB foi colhido em irregularidades em São Paulo e mesmo assim ficou no poder.
Os partidos tradicionais seguiram ditando as regras eleitorais e elegendo seus quadros para os principais cargos. E o eleitor, que não enxergava alternativas viáveis, acabou vendo materializar-se em Bolsonaro um caminho que a ele parecia ser fora do sistema. O crescimento daquela candidatura consolidou a esperança de mudança do brasileiro que foi às ruas em 2013 ou que silenciosamente apoiou as manifestações.
Nos estados, os bolsonarinhos pipocaram e fizeram a maior renovação de bancadas na história do Congresso. O partido de Bolsonaro elegeu 52 deputados e quatro senadores. Outros partidos pequenos e mesmo tradicionais causaram surpresa ao aparecerem à saída das urnas com nomes novos. Mas o mais importante foram os aspirantes a capitão que se consolidaram nas disputas pelos governos dos estados.
Atendo-se apenas ao segundo turno, três exemplos mostram bem que o que se vê hoje é mais do que antipetismo. Aqui no Rio, Wilson Witzel está liderando com 61% das intenções de voto não apenas por se apresentar com o mesmo estilo de Bolsonaro. Mas também porque disputa contra Eduardo Paes. Embora tenha sido um excelente prefeito e em tempos normais seria franco favorito, Paes fez parte do sistema. No caso, o MDB de Cabral e Picciani.
Em Minas, com o PT de Fernando Pimentel fora da disputa do segundo turno, o novato Romeu Zema cresceu com a mesma lógica que garante a liderança a Witzel no Rio. Ele tem 71% das intenções de votos contra 29% do seu adversário. O ex-governador Antonio Anastasia, que fez um mandato elogiado em seu estado, deve ser massacrado nas urnas pelo fato de ser do PSDB de Aécio Neves.
O PT também está fora da equação no DF. Lá, o líder das pesquisas é Ibaneis Rocha, com 75% contra 25% do governador Rodrigo Rollemberg. E a maior curiosidade, que mostra como é difuso e meio perdido este sentimento de mudança que sacode o Brasil. Ibaneis é candidato do MDB. Sim, do MDB de Renan Calheiros e Eduardo Cunha. Ocorre que em Brasília o sistema a ser batido é representado pelo governador que tenta a reeleição. O que está em curso é um voto antissistema, bem além do antipetismo que conhecemos.
ESQUEÇAM TUDO
É emocionante o esforço do PT na busca do centro para tentar uma cada vez mais improvável vitória no segundo turno da eleição presidencial. Já fez quase tudo: renegou a Constituinte exclusiva, desautorizou e enxotou José Dirceu, passou a elogiar a imprensa, o Ministério Público e o juiz Sergio Moro e mudou seu programa em pontos sensíveis como o da legalização das drogas. Só falta agora chamar o Pérsio Arida.
MALANDRAGEM
O PSL está fazendo uma campanha de filiação camuflada nas redes sociais, surfando no sucesso de Bolsonaro. Nos posts, o partido pede dados do internauta (nome, endereço, e-mail, CPF, título) como se fosse pedido do candidato. Até o dia 28, o PSL pode ter mais filiados que o PT e o MDB graças a essa malandragem.
MINISTRA
A senadora Ana Amélia, candidata a vice derrotada na chapa de Alckmin, está com um pé num eventual governo Bolsonaro. Cotadíssima para o Ministério das Relações Exteriores, também pode ser encaixada na Agricultura. Se for para o Itamaraty, deve ser a única mulher no ministério. Se for para a Agricultura, outra mulher assumirá as relações exteriores. Ana Amélia declarou que apoiaria Bolsonaro antes mesmo do primeiro turno.
PERGUNTINHAS CHATAS
O PT apoia Anastasia em Minas? E Paes no Rio? O discurso do fim do mundo serve para o Brasil mas não cabe nos estados? Ou será que os candidatos recusam o apoio do PT para evitar evasão ainda maior de votos?
FASCISMO E FASCISTAS
O PT usou e abusou das palavras fascismo e fascistas para designar todo tipo de oposição que teve ao longo dos seus anos de poder. Usou-as para atacar partidos, políticos, entidades de classe, jornalistas, juízes. Agora, quando mais faz sentido empregá-las, mesmo que para desenhar uma hipótese futura, as palavras parecem velhas e cansadas aos ouvidos dos brasileiros.
ARROJADO
Em outro trecho da gravação que vazou no início da semana do juiz Witzel ensinando a engenharia para aumentar seus vencimentos, o candidato diz que investe na Bolsa: “A Bolsa caiu, eu coloco meu dinheiro lá. Eu sou arrojado. Minha mulher é advogada e tem dinheiro, então eu posso ser arrojado”.
PEGADINHA
O restaurante Maní aos poucos está voltando ao normal depois da onda de agravos pelo post #EleNão da chef Helena Rizzo. Mas ainda vai ter que ter muita paciência. No sábado passado, reservaram mesa no restaurante os senhores Fidel Castro, Nicolás Maduro, Josef Stalin, Ho Chi Min e Mao Tsé-Tung. E, claro, não apareceram.
MULHERES DO CAPITÃO
O #EleNão definitivamente não abraçou a maioria. Até mesmo o PMB, Partido da Mulher Brasileira, apoia Bolsonaro. Pelo menos a presidente paulistana da sigla, Pricila Menin, declarou seu voto no capitão.
O Globo