Fernanda Krakovics e Miguel Caballero - O Globo
Em caravana pelo Brasil para fazer pré-campanha eleitoral e se defender dos processos que enfrenta na Justiça, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva esteve no Rio na semana passada, mas teve baixa adesão no estado que lhe deu 69% dos votos no segundo turno de 2006, quando foi reeleito. Seu público no Rio foi turbinado pela mobilização feita por sindicatos e pela convocação de servidores de prefeituras do PT e de aliados políticos. Mas os eventos também atraíram eleitores de pleitos anteriores, que se sentem beneficiados pela gestão do petista.
Lula tentou se distanciar do ex-governador Sérgio Cabral (PMDB), que está preso por corrupção e lavagem de dinheiro. O petista foi o principal cabo eleitoral de Cabral nas eleições de 2006 e 2010 — ano em que declarou ser “uma obrigação moral, ética, política” o voto do eleitor fluminense no governador buscando reeleição. Na época, não se cansava de decantar com frequência sua amizade com o peemedebista.
Na semana passada, o tom foi outro. Em Campos, no Norte Fluminense, na noite da última segunda-feira, Lula disse que “o povo do Rio foi traído” pelos políticos que “roubaram o estado”. Na noite seguinte, em Maricá, na Região dos Lagos, afirmou que o Rio tem de “voltar a ter gente honesta” no governo.
— Como é que esse povo (do Rio) foi tão traído por alguns políticos que, em vez de governar, roubaram esse estado? Roubaram a confiança de vocês — disse Lula, em discurso em Campos.
Mesmo reconhecendo a “traição” do estado pelos políticos,o ex-presidente atribuiu a crise por que passa o Rio à Lava-Jato, que, segundo ele, teria quebrado a indústria do petróleo, e à falta de apoio do governo Michel Temer. Os investimentos do governo federal no Rio nos anos Lula foram sempre alardeados como prova da parceria e amizade entre o petista e Cabral.
BOLSONARISTAS CONTRA LULA
No caminho de Lula não faltaram protestos. Tanto em Campos quanto em Nova Iguaçu, na última quinta-feira, simpatizantes do deputado Jair Bolsonaro (PSC-RJ), outro pré-candidato à Presidência, compareceram com faixas como “Lula, ladrão, seu lugar é na prisão” e “Deus nos livre da esquerda”. Lula está à frente das pesquisas para o Planalto, seguido por Bolsonaro.
Em Campos, Lula fez críticas ao deputado sem citar seu nome. A polarização com Bolsonaro interessa ao petista, e a passagem pelo Rio foi também uma forma de demarcar território onde o adversário é popular.
Em três ônibus, Lula e sua equipe chegaram a Campos na noite de terça-feira. O percurso incluiu Maricá, única cidade do estado administrada pelo PT; Itaboraí, na Região Metropolitana do Rio; e cidades da Baixada Fluminense. A caravana foi encerrada na noite de sexta, na Universidade do Estado do Rio (Uerj), o ato que teve maior público no Rio.
O PT afirma que a viagem e seus eventos foram custeados pelo partido. Essa é a terceira caravana de Lula pelo Brasil este ano, e incluiu o Espírito Santo. A primeira foi pelo Nordeste, em agosto, e a segunda percorreu Minas, em outubro.
Na manhã da última quinta-feira, Lula fez um ato em frente ao Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj), em Itaboraí, um dos maiores símbolos do esquema de corrupção na Petrobras revelado pela Lava-Jato. O juiz Sérgio Moro condenou Cabral a 14 anos de prisão por recebimento de R$ 2,7 milhões em propinas pelas obras de terraplanagem do empreendimento.
Em abril de 2008, o então presidente Lula participou, ao lado de Cabral, da cerimônia de início das obras do Comperj, que faziam parte do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), carro-chefe do segundo mandato do petista no Palácio do Planalto.
‘SÓ VIM GANHAR MEU DINHEIRO’
Na quinta, Lula foi barrado e teve que fazer o ato na porta do complexo. A administração chamou a polícia, que fez uma barreira com cinco carros no acesso ao Comperj.
— Se o empresário roubou, ele tem que estar preso. O que não pode é você fechar a empresa. Tem muita gente que roubou, fez acordo e está vivendo uma vida de nababo com metade do que roubou. E quem pagou o pato foram 197 mil trabalhadores da Petrobras que já perderam o emprego. E 50 mil da indústria naval — discursou Lula, em cima de uma caminhonete adaptada para se tornar carro de som pertencente à Central Única dos Trabalhadores (CUT) de São Bernardo (SP), seu berço político.
Uma Kombi do Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias da Construção Civil e Montagem Industrial de Caxias, São João de Meriti, Nilópolis, Magé e Guapimirim distribuía sanduíches e bananas para homens que aguardavam a chegada de Lula ao Comperj. Doze ônibus levaram sindicalistas e ex-trabalhadores das obras, paralisadas desde o fim de 2014.
Em Magé, uma moça de 19 anos que segurava uma bandeira com o símbolo da caravana petista riu ao ser indagada sobre sua militância no PT:
— Só vim aqui ganhar o meu dinheiro.
No mesmo ato, Rosângela Barbosa chorou ao dizer que o marido, pintor, está há três anos desempregado. Acompanhada de um filho com síndrome de Down, a aposentada disse acreditar que sua vida vai melhorar se Lula voltar a ser presidente:
— Eu me aposentei por causa dele (Lula). Tenho úlcera varicosa. Ele vai vir e ajudar meu marido.
Em uma mostra do atual isolamento político, Lula foi acompanhado nos palanques basicamente por petistas, como o senador Lindbergh Farias e a deputada Benedita da Silva. As exceções foram o deputado Celso Pansera (PMDB-RJ), ex-ministro da presidente Dilma Rousseff que votou contra o impeachment; e a deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ).