segunda-feira, 14 de agosto de 2017

Coalizão de Macri supera Cristina em primárias ao Senado


Em Buenos Aires, o presidente Mauricio Macri vota para as primárias abertas pré-eleições legislativas de outubro - MARCOS BRINDICCI / REUTERS


Com O Globo e AFP




BUENOS AIRES - O retorno às urnas da ex-presidente Cristina Kirchner como pré-candidata ao Senado pela oposição ao presidente Mauricio Macri foi desafiado pelo bom desempenho da coalizão do presidente, que saiu na frente das primárias obrigatórias na Argentina para as eleições legislativas de 22 de outubro. Os primeiros resultados oficiais mostraram vantagem dos macristas em províncias-chave e até em Buenos Aires, o distrito de Cristina.

Num dia de primárias para as eleições legislativas argentinas — prévias habitualmente vistas como termômetro político para o ocupante da Casa Rosada — Mauricio Macri mostrou força frente às aspirações de retorno da ex-presidente Cristina Kirchner. Sua coalizão, a Mudemos, apareceu como vitoriosa por todo o país nas prévias dos resultados, impondo-se como principal força. Os holofotes, no entanto, também recaíram sobre aspirações de sua antecessora, Cristina Kirchner. A ex-presidente, que ao longo dos últimos meses construiu a imagem de opositora do ajuste fiscal de seu maior rival político, tenta uma vaga ao Senado e é hoje a maior ameaça ao domínio dos macristas.

As prévias abertas servem para fechar as listas dos partidos para as eleições de 22 de outubro, quando os argentinos renovarão a metade da Câmara dos Deputados e um terço do Senado. Até agora em minoria, Macri vinha fechando alianças com peronistas afastados de Cristina.

Na província de Buenos Aires, esperava-se um resultado apertado entre Cristina e seu principal rival local, o ex-ministro macrista Esteban Bullrich, cuja lista eleitoral aparecia na apuração com pelo menos cinco pontos percentuais acima da Unidade Cidadã, novo movimento da ex-presidente. Mas na capital e nacionalmente, dirigentes da Mudemos viram com otimismo os primeiros resultados parciais, aparecendo bem à frente dos rivais kirchneristas em várias províncias-chave.


Alto comparecimento

A participação eleitoral foi estimada em 74% — bom sinal para o governo, que vê um alto comparecimento no interior como crucial nas legislativas, garantindo assentos em áreas tradicionais da centro-esquerda, como Santa Fe e Córdoba.

Sempre controversa, Cristina tentou manter discrição. Durante o dia, só publicou uma foto com o neto Néstor Iván, filho do já deputado Máximo Kirchner. Mas despertou críticas dos partidários de Macri: candidata na província de Buenos Aires — principal distrito eleitoral do país e maior base política kirchnerista — é eleitora em Santa Cruz (província patagônica 2.500 quilômetros ao sul). E não foi votar, alegando falta de voos diários para casa.

— Que fique claro que agora há mais voos da Aerolíneas Argentinas (principal companhia aérea do país) do que antes uz — ironizou o chefe de Gabinete de Macri, Marcos Peña. — Tem que dar explicações sobre este tema e muitos outros.

O retorno de Cristina à política divide o país. Críticos lembram que uma vaga no Senado lhe daria imunidade nos vários casos de corrupção a que responde. Mas sua base se mantém leal a ela, que tenta consolidar a imagem de oposição organizada ao macrismo. 

Em sua última mensagem de campanha, na quinta-feira, pediu a seus eleitores que lembrem “dos que perderam o trabalho ou vivem com medo de perdê-lo, dos que o salário não chega ao fim do mês, ou dos que não podem comprar comida, ou pagar a luz, o gás ou a água”.

— Esse deve ser o limite para este governo — afirmou ela, desafiando o projeto do sucessor.



Cristina Kirchner faz comício em junho: ex-presidente quer voltar ao centro da política argentina - MARCOS BRINDICCI / REUTERS


Desafio maior para outubro

Com um ano e meio de governo, Macri fez campanha como se elegeu e governa. Defendeu a ruptura total com o aparelhamento institucional kirchnerista e o seu modelo econômico (industrialista e de forte controle do Estado na economia). Com um Gabinete ligado ao empresariado, abriu a economia a novos investimentos, desregulamentou o setor financeiro e reduziu impostos do agronegócio, apostando no reaquecimento da economia. Mas tem sofrido para reerguê-la, para trazer os prometidos investimentos estrangeiros e para reverter a escalada inflacionária (nos sete meses deste ano, acumula 13,9%), o desemprego e a pobreza. E, ao mesmo tempo em que o macrismo aponta a série de casos de corrupção envolvendo Cristina, o próprio presidente viu seu nome envolvido no escândalo do Panama Papers por ter sociedades offshore em paraísos fiscais.

Uma vitória de Cristina ao Senado pode ainda embaralhar o cenário político para as eleições presidenciais de 2019 e dificultar a vida de Macri, acreditam analistas:

— Trabalho, previdência e reforma fiscal precisarão de acordos — destacou o analista político Rosendo Fraga, citando temas nos quais o kirchnerismo tem força política. — Se vencer em Buenos Aires, o governo vai para estas negociações fortalecido. Se perder, vai muito mais enfraquecido.