quarta-feira, 5 de julho de 2017

"Pêndulo chileno", editorial da Folha de São Paulo

Olga Maltseva/AFP
Football fans watch a screen showing the 2017 Confederations Cup final football match between Chile and Germany in central Saint Petersburg on July 2, 2017. / AFP PHOTO / Olga MALTSEVA
Garoto com a bandeira do Chile pintada no rosto



Considerado atualmente uma ilha de normalidade institucional na América Latina, o Chile se prepara para ir às urnas sob circunstâncias menos auspiciosas do que as observadas no passado recente.

Redemocratizado em 1990, o país banhado pelo Pacífico teve desde então presidentes que, além de iniciarem e concluírem seus mandatos sem interrupções, governaram comprometidos com um razoável consenso em torno de abertura econômica, gasto público reduzido e rechaço ao populismo.

O quadro se completa com a alternância de poder sem sobressaltos: após duas décadas no comando do país, a aliança de centro-esquerda Concertação deu lugar, em 2010, ao conservador Sebastián Piñera, que quatro anos depois devolveria a faixa à atual presidente, Michelle Bachelet.

Vitorioso em primárias no domingo (2), é agora Piñera quem ensaia possível retorno ao Palácio de La Moneda. Registra 31% das intenções de voto em pesquisa realizada em junho, mais que a soma dos índices de seus dois principais adversários.

É precipitado, porém, fazer apostas a essa altura —o pleito ocorrerá apenas em novembro, com eventual segundo turno no mês seguinte.

São competitivos ainda o senador governista Alejandro Guillier, com 15% (em tendência de queda), e a jornalista Beatriz Sánchez, com 13% (em alta). Integrante da esquerdista Frente Ampla, inspirada na homônima uruguaia e no espanhol Podemos, a candidata constitui a novidade na eleição.

Seu grupo político origina-se de movimentos de rua que cobram reformas no ensino; colhe votos à esquerda na esteira da impopularidade do governo Bachelet, rejeitado por 63% dos chilenos.

A presidente se revelou ineficaz na condução da ambiciosa agenda de reformas que a elegeu. Falhou na tentativa de aprovar uma nova Constituição —a atual nasceu na ditadura de Augusto Pinochet— e viu crescer a insatisfação popular com os modelos previdenciário e educacional, além do desempenho econômico medíocre.

Será em ambiente de inquietação, portanto, que o país sufragará seu próximo mandatário. Trata-se de uma sociedade ainda bastante desigual, que entretanto mantém boa chance de completar a transição rumo ao mundo desenvolvido.