quinta-feira, 18 de maio de 2017

Crise política faz Bolsa cair 8,75% e dólar subir a R$ 3,38


 
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Juliana Garçon - O Globo

Sob impacto do noticiário de Brasília — ontem, o pacote de dez medidas anticorrupção foi votado na Câmara e, hoje, o projeto que altera a legislação referente ao abuso de autoridade é debatido no Senado —, os mercados de câmbio e de ações reagiram no Brasil, descolados do cenário internacional. O dólar fechou em alta de 2,42%, a R$ 3,469, após atingir R$ 3,48, enquanto a Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) encerrou em queda de 3,88%, a 59.506,53 pontos. Das 58 ações do Ibovespa, apenas três fecharam em alta.
O mercado de juros também estressou e registrou alta dos contratos futuros, apesar do corte, ontem, de 0,25 ponto percentual da Selic (referência de juros no Brasil), para 13,75%, pelo Banco Central.
Num pregão de movimentação forte — o giro financeiro foi R$ 10 bilhões, contra a média diária de R$ 7,37 bilhões neste ano —, a Bolsa chegou a afundar 4,63% antes de atenuar as perdas. O volume financeiro vem crescendo: em novembro, foi de R$ 9,27 bilhões, o maior em dois anos. O resultado atípico é atribuído às movimentações que se seguiram à eleição de Donald Trump. No período, os investidores estrangeiros tiraram R$ 2,845 bilhões do mercado. O Ibovespa caiu 4,65% no mês passado, mas acumula alta de 42,8% no ano.
Sócio da Eleven Financial, Rafael Bevilacqua aponta a crise política como principal causa para o mal estar desta quinta-feira:
— O Brasil expõe novamente a corrosão das instituições e deixa os investidores assustados. Isso sem falar na [Operação] Zelotes. Os investidores avaliam que a crise em Brasília vai retardar as reformas fiscais — diz. — Também houve investidores embolsando os ganhos de ontem, e há quem reduza posições porque estamos no fim do ano e é preciso garantir as performances. Ninguém quer ser afetado pelas perdas.
— A questão é política — concorda Alexandre Espirito Santo, economista da plataforma de investimentos Órama. — O país precisa das reformas e essa dependem do Congresso. Como a economia está numa anemia profunda, as coisas precisariam ter mais celeridade. Como, se houver uma nova rodada de estresse político?
Os investidores institucionais veem ameaças às medidas anticorrupção e à Operação Lava Jato se acumulando num cenário de desemprego em alta e PIB em queda, destaca Alison Correia, analista da XP Investimentos. A manobra de Renan Calheiros [para votar com urgência as medidas anticorrupção] acendeu a luz amarela dos investidores instituicionais, afirma:
— Todo mundo está se perguntando: será que o governo Temer é uma continuação do anterior? E tem a megadelação da Odebrecht para sair. Além disso, o dia começou com diligências da Operação Zelotes nos escritórios do maior banco privado do país.
Paulo Figueiredo, diretor de Operações da FN Capital, também avalia que os estrangeiros estão se afastando, diante da percepção de riscos crescentes:
— O mercado ficou muito instável: os estrangeiros estão com recio do que pode acontecer com a delação da Odebrecht e a crise entre Legislativo e Judiciário.
Assim, o mercado brasileiro andou na contramão do internacional. O dólar caía 0,46%, conforme o Dollar Index Spot, que compara a moeda americana com uma cesta de dez divisas globais.
Também pesa no câmbio a combinação de queda de juros no Brasil com alta de juros nos EUA, diz Paulo Gomes, estrategista da Azimut Wealth Management. Considerados os investimentos mais seguros do mundo, os Treasuries (títulos de dívida do governo nos EUA) estão com rendimentos em alta: estavam em 2,38% ontem e chegaram a 2,468% hoje — maior taxa em 16 meses —, com perspectivas de inflação mais alta devido à valorização do petróleo e aos planos expansionistas de Donald Trump. Os títulos de cinco anos foram a 1,92%, maior taxas em cinco anos e meio.
— Com esses fatores, diminui a atratividade do mercado brasileiro para os investidores internacionais.
No mercado de juros, os contratos para janeiro de 2019 fecharam em 11,94%, alta de 2,93 pontos percentuais. Para 2021, marcaram 12,29%, avanço de 4,16%. Para 2023, a alta foi de 4%, a 12,48%.
— A alta veio apesar do comunicado mais leve do Banco Central. O mercado estressou muito, com os riscos aumentando — analisa Espirito Santo.
MERCADO DE AÇÕES
Na Bovespa, os bancos registram declínio. Itaú perdeu 4,5%, num dia em que sofreu diligência da Polícia Federal, que buscava documentos relativos a processos tributários do BankBoston, cujas operações no Brasil foram compradas pela instituição paulista em 2006. Banco do Brasil tombou 6,59%. Bradesco, 5,57%. Santander, de 7,99%.
Com a virada de Petrobras, que chegou a avançar, ainda beneficiada pelo avanço do petróleo no mercado internacional, arrastou todo o mercado. A estatal declinou 1,4% no papel ON (ordinárias, com direito a voto), a R$ 18,21, e 3,5% no PN (preferencias, sem voto), a R$ 15,44.
A desvalorização contaminou companhias de diversos setores. CCR, de rodovias, despencou 7,95%. A aérea Gol, 8,3%. JBS, 7,06%. Pão de Açúcar cai 7,23%. Natura despenca 11,75%.
A mineradora Vale, beneficiada por nova disparada do minério de ferro — nesta manhã, teve a commodity teve valorização de 8,17% na China — foi uma das únicas na contramão. As ações ON da Vale subiram 1,45%, mas as PN caíram 0,97%. Também tiveram alta Fibria (1,74%) e Embraer (2,11%).
— A Bolsa e o câmbio ficaram sincronizados, acentuando os movimentos diante do crescimento das incertezas — comenta Correia, da XP Investimentos. — Houve um sentimento de euforia com a saída de Dilma Rousseff, uma sensação de que o Brasil estava virando a chave. Agora, os estrangeiros já não têm mais essa certeza e estão saindo de investimentos por aqui.
Em Wall Street os índices acionários são impulsionados pelas empresas de energia. O Dow Jones ganha 0,37% e o S&P perde 0,34%. Na Europa, as bolsas fecharam em queda: em Londres, o FTSE 100 perdeu 0,45%; em Frankfurt, o Dax declinou 1%; em Paris, o CAC cedeu 0,39%.