domingo, 16 de abril de 2017

Roberto Campos, o mestre desiludido

Paulo Rabello de Castro -  O Estado de São Paulo

Campos dizia que a modernidade traz estabilidade, mas o processo de modernização deflagra instabilidade


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"Roberto Campos foi, sem dúvida e sem qualquer demérito aos demais atores de um grande elenco de artífices da “arrancada” brasileira, o mais importante conceituador e realizador da magna obra desenvolvimentista do Brasil republicano. Embora nunca tenha detido a última palavra, pois jamais chegou à Presidência da República, Campos fez uso, como assessor de governos, diretor de banco público e ministro do Planejamento, de todas as armas da persuasão para influir no pensamento de quem comandava politicamente a República, seja como organizador do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico, o BNDE, passando pela conceituação do Plano de Metas do governo JK, seja articulando o mal conhecido “programa de governo” no efêmero regime parlamentarista de Tancredo Neves (1962), até a sequência magistral de modernizações institucionais conduzidas no período de Castelo Branco.
Ao deixar o governo, no início de 1967, ele se tornaria assistente passivo de um desmoronamento inelutável do impulso de crescimento acelerado do País, condição essencial à inclusão permanente das chamadas “massas pobres” ao circuito de afluência dos mercados e da acumulação de capital. O Brasil viu seu sonho de desenvolvimento escorregar, devagar, mas inexoravelmente. Contudo, quer como senador constituinte, quer como deputado federal, até pouco antes de sua definitiva saída de cena, em 2001, com 84 anos, Roberto Campos não arredou pé de sua insistente e monocórdica peleja por fazer o Brasil reencontrar o rumo coletivo. Ele ficava sonhando a possibilidade de um “ressurgimento”, talvez reminiscência da sua formação cristã, assentada na esperança da ressurreição.
O desiludido mestre do desenvolvimento ainda teve tempo de conferir a justeza dos seus piores presságios. Num texto publicado em obra coletiva, pelos idos de 1974 (Ensaios econômicos, APEC Editora), Campos escreve um premonitório texto, despojado da conhecida veia irônica, sobre o que chama, não sem um quê dramático, de “A teoria do colapso”.
Roberto estava, mais uma vez, sofrendo de aguda premonição do que estaria por vir. Ao provocar a celeuma sobre a “arrancada interrompida”, muito antes do tempo de maturação da tragédia que se seguiria, sua teoria do colapso foi recebida e lida com respeitosa indiferença. Campos se apoia em Samuel Huntington (Political Order in Changing Societies, Yale University Press, 1968) para construir sua teoria. Parafraseando Huntington, admite como teorema principal que “a modernidade traz estabilidade, mas o processo de modernização deflagra instabilidade”. As aspirações do povo se expandem geometricamente, enquanto a racionalidade política se vai adquirindo apenas em evolução aritmética. Assim conclui Roberto Campos, ao estabelecer uma equação profética do colapso do crescimento acelerado do Brasil, vergado pelas incontidas, embora compreensíveis, demandas sociais acumuladas e concedidas em Carta Magna pelos constituintes de 1988.”
SERVIÇO:
Obra: Lanterna na Proa - Roberto Campos ano 100
Autores:Ives Gandra da Silva Martins e Paulo Rabello de Castro (organizadores)
Editora: Resistência Cultural
Preço: Não divulgado
* PAULO ROBERTO DE ALMEIDA, ORGANIZADOR DO LIVRO “O HOMEM QUE PENSOU O BRASIL”, É DIRETOR DO INSTITUTO DE PESQUISA DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS (IPRI)