sexta-feira, 9 de outubro de 2015

"Tiro pela culatra", por Bernardo Mello Franco

Folha de São Paulo


A ofensiva contra o ministro Augusto Nardes foi mais um tiro do governo Dilma que saiu pela culatra. Além de ter as contas rejeitadas, como já era esperado, o Planalto foi acusado de tentar intimidar o Tribunal de Contas da União.

Às vésperas do julgamento, o governo tentou afastar o relator do caso. Para anunciar a ideia, organizou uma inusitada entrevista de três ministros em pleno domingo. Eles acusaram Nardes de antecipar o voto que condenaria as pedaladas fiscais.

O relator não deixou dúvidas de que pediria a rejeição das contas. Deu entrevistas inflamadas, recebeu militantes pró-impeachment e declarou que a corte faria "história". Chegou a usar o Facebook para amplificar elogios que recebeu.

O comportamento incomodou alguns ministros do TCU, que cogitavam não endossar a reprovação das contas. No entanto, o ataque do governo estimulou uma reação unânime em solidariedade a Nardes.

Em órgãos com mandato vitalício, o espírito de corpo costuma prevalecer sobre divergências individuais. Isso tendia a ser mais forte no TCU, que tem quatro entre nove ministros citados em investigações criminais.

A ofensiva contra Nardes transformou uma provável derrota numa surra com direito a sermão. "Quero registrar minha indignação", discursou o ministro substituto André Luiz de Carvalho. Foi aplaudido pelos colegas e por deputados da oposição que lotavam o plenário da corte.
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O deputado Eduardo Cunha usou passaporte diplomático para abrir contas secretas na Suíça. A cópia do documento está entre os papéis que provam a ligação do deputado com US$ 2,4 milhões bloqueados no país.

Esse tipo de passaporte, de capa vermelha, garante tratamento especial no exterior. É emitido para autoridades e pessoas que viajam em atividades de "interesse do país".

No caso das contas secretas, o interesse era só de Eduardo Cunha.