domingo, 5 de julho de 2015

"O fisiologismo sai do armário", por Ricardo Fiuza

Epoca


Lula está fazendo a parte dele. O ex-presidente informou ao país: “A gente só pensa em cargo”



Dilma Rousseff está no volume morto, conforme definição de seu padrinho, alcançando o formidável índice de reprovação de 65%. Só Collor conseguiu superar essa façanha, às vésperas do impeachment – quando era rejeitado por 68% dos brasileiros. Será que se o gigante acordar mais 3% o Brasil toma jeito? Lula está fazendo a parte dele: além de alertar que a sua criatura está na lama, o ex-presidente informou ao país: “A gente só pensa em cargo”. Demorou, mas finalmente o fisiologismo petista saiu do armário.

A confissão de Luiz Inácio da Silva é um dos momentos mais dramáticos da história recente. Percebendo a si mesmo e a seu partido afundados no volume morto da política nacional, o número um abriu o peito e soltou lá de dentro a verdade sufocada, dolorida, obscena: o PT só pensa em emprego, só pensa em “ser eleito” como meio de vida, para viver à custa do Estado brasileiro fantasiado em bandeiras bondosas. Claro que Lula quis dizer que o PT ficou assim, tipo de repente, mas não é preciso ser psicanalista para captar a autodelação: “A gente só pensa em cargo” – é assim que somos, e sempre fomos. O famoso “partido da boquinha”, conforme apelido cirúrgico criado por um colega de populismo parasitário.

Se existisse justiça divina, estariam todos na boquinha do inferno: qual a pena para quem forja consciência social com o fim de espoliar conscientemente a sociedade? O padre pedófilo transforma seu protegido em vítima, vendendo segurança espiritual para se servir da carne. Os petistas prometem o céu para se locupletarem na Terra. “A gente só pensa em cargo.” Até que enfim o oráculo jogou o óbvio na cara do Brasil. Não há mais tempo para autoengano: o partido que governa o país há 12 anos foi, é e será fisiológico. Não há São Levy que possa fazer transplante de alma em vampiro.

Descendo da Bíblia companheira à justiça terrena: uma vasta operação policial expôs o maior esquema de corrupção da história da República, montado sob o governo do partido que só pensa em cargo. O tesoureiro desse partido é réu nesse escândalo e está preso. Entre outras atribuições, esse tesoureiro cuida de abastecer as campanhas dos companheiros que “só pensam em ser eleitos”, conforme explicou o número um. Entre as campanhas abastecidas por dinheiro roubado da maior estatal do país, segundo as investigações, está a da presidente da República. Entre os presos por operar o esquema estão dois diretores da estatal indicados ou protegidos pelo partido que só pensa em cargo. Aí surge o milagre brasileiro: nenhuma investigação – nenhuma – envolve os governantes do país, representantes do partido que só pensa naquilo.

A mais recente etapa da vasta operação policial prendeu donos de empreiteiras envolvidas no esquema – pelo menos uma delas com claros indícios de promiscuidade com o ex-presidente Lula. Ninguém flagrou algum desses empresários corrompendo ninguém. Eles foram presos segundo a teoria de domínio do fato, isto é, autoria indireta dos crimes. A Justiça é cega, mas não é burra, e sabe o que é cadeia de responsabilidades. Claro que no Brasil ninguém nunca é responsável por nada – todo delito é obra de algum aloprado que agiu por conta própria. Mas a prisão dos empreiteiros quebrou essa lógica, e a pergunta agora é: onde está a teoria de domínio do fato para implicar as autoridades governamentais?

A cadeia de responsabilidades do petrolão está mais do que exposta, cantada em prosa e verso nas delações premiadas, nos jornais e nas TVs: um sistema bilionário de corrupção envolvendo a cúpula da Petrobras não poderia funcionar por mais de década sem algum nível de conivência do Palácio do Planalto.

Seria obra de alguns aloprados que só pensam em cargos e em dinheiro para se elegerem? Não. Agora sabemos que essa conduta não é desvio, é DNA. Quando foi defenestrado pelos brasileiros, Collor tinha dois anos de peripécias, não 12. Não tinha petrolão nem mensalão no currículo. Não tinha sido flagrado em pedaladas fiscais e contabilidade criativa para torrar escondido o dinheiro do contribuinte. Não tinha avacalhado a estabilidade econômica trazendo de volta a inflação que estava controlada.

Ou o Brasil resolve isso agora, ou assume de uma vez que virou agência de empregos.