domingo, 24 de maio de 2015

Em Nova York, a renovação começa pelo alto

Isabel de Luca - O Globo

Observatório do One World Trade Center marca revitalização de área atingida por ataque às Torres Gêmeas

Vista. Mulher fotografa Nova York do 100º andar do One World Trade Center: prédio marca a revitalização da Baixa Manhattan. Ao lado, jornalistas observam o Sky Portal, que mostra imagens da rua em alta definição Foto: MIKE SEGAR / MIKE SEGAR/REUTERS
Vista. Mulher fotografa Nova York do 100º andar do One World Trade Center: prédio marca a revitalização da Baixa Manhattan. Ao lado, jornalistas observam o Sky Portal, que mostra imagens da rua em alta definição - MIKE SEGAR / MIKE SEGAR/REUTERS


NOVA YORK — A viagem de elevador dura 48 segundos. No percurso até o 102º andar do One World Trade Center — a torre mais alta do Ocidente, cujo observatório será aberto ao público na próxima sexta-feira —, o visitante acompanha, graças a uma projeção virtual em alta definição que faz as paredes parecerem janelas, a evolução da paisagem urbana de Nova York desde 1500. Lá no alto, quem se dispuser a pagar o ingresso de US$ 32 (R$ 98) encontrará uma série de atividades interativas, três restaurantes e uma loja. Mas a estrela, claro, é a vista panorâmica de 360 graus, que descortina todos os ícones da cidade, incluindo a frenética rota dos helicópteros bem abaixo da nossa linha de visão.

 
A inauguração do mirante é um marco da reconstrução do local onde ficavam as Torres Gêmeas até 11 de setembro de 2001. Quase 14 anos depois do maior atentado terrorista já ocorrido em solo americano, o complexo do World Trade Center finalmente começa a ganhar corpo — e transforma, de carona, todo o seu entorno. O progresso vinha se anunciando lentamente: a praça memorial estabelecida em 2011 nas fundações dos dois prédios que foram abaixo já atraiu cerca de 19 milhões de pessoas; o museu que lembra a tragédia anunciou na semana passada que recebeu 2,7 milhões de pagantes em seu primeiro ano de funcionamento; e os dois prédios já construídos vêm sendo ocupados, aos poucos, por empresas como a editora de revistas Condé Nast. Mas maio e junho prometem uma novidade atrás da outra.

Restaurantes estrelados

Trechos de ruas e calçadas estão desimpedidos pela primeira vez desde que a área virou uma zona de guerra. A estação do serviço de trem que movimenta 50 mil passageiros por dia entre Manhattan e Nova Jersey acaba de ganhar novas plataformas projetadas pelo espanhol Santiago Calatrava. E o polêmico terminal de transportes do arquiteto, orçado em US$ 3,9 bilhões (R$ 11,9 bilhões) e cravejado com uma escultura branca batizada de Oculus, terá o primeiro trecho aberto ao público nas próximas semanas. Ao sul do complexo do WTC, foi plantada na última terça-feira a primeira árvore do futuro Liberty Park, um parque elevado de quatro mil metros quadrados que terá como vizinho um santuário em substituição, ao custo de US$ 50 milhões (R$ 153,2 milhões), de uma igreja ortodoxa destruída no atentado. Do lado oeste, o antigo World Financial Center — rebatizado de Brookfield Place após uma renovação de US$ 250 milhões (R$ 766 milhões) — atrai uma legião de restaurantes estrelados e lojas de grife.

— Acredito piamente que este bairro vai ser o foco e o âmago das atividades turísticas em Nova York. Basta andar nas ruas para ver que há gente por todo canto, e coisas abrindo por todo lado. Quando tudo estiver funcionando, tenho certeza de que esta região vai ser mais disputada do que Midtown — diz Dave Kerschner, presidente de hospitalidade da Legends, a operadora do One World Observatory, durante uma visita guiada a 400 metros do chão. — Acho que os turistas vão começar por aqui, no prédio batizado de número um, pois é o melhor lugar para ver o que Nova York tem de melhor.


Jornalistas no Sky Portal - TIMOTHY A. CLARY/AFP


A empresa não revela o custo do projeto do mirante, que prevê entre três e quatro milhões de visitantes por ano. Enquanto se espera por um dos cinco elevadores — que foram batizados de Sky Pods e estão entre os mais rápidos do mundo —, uma videoinstalação mostra entrevistas com os diversos trabalhadores que construíram o arranha-céu. A primeira parada é num cinema cuja tela eventualmente se retrai para mostrar, de surpresa, a cidade 102 andares abaixo. O principal mirante fica no 100º, onde monitores interativos em HD trazem informações sobre os ícones nova-iorquinos avistados lá de cima e um círculo mostra imagens em tempo real captadas por uma câmera instalada no topo da espiral do edifício. O observatório ficará aberto diariamente, das 9h à meia-noite.
— Esta é certamente a melhor vista de Nova York, mas por ser muito mais do que simplesmente uma vista, acho que é o melhor observatório do mundo — arrisca Kerschner.

Um dos primeiros a visitar o mirante, na semana passada, o prefeito Bill de Blasio celebrou que chamou de “renascimento da parte baixa de Manhattan”. A região tem, hoje, mais moradores do que antes do ataque terrorista. O turismo corre cada vez mais solto. Mas como a aposta na revitalização inflacionou os aluguéis, as novas torres de escritórios seguem com grandes áreas livres. O icônico One World Trade Center, por exemplo, tem apenas 63% do espaço ocupado. Já a terceira das quatro torres previstas para o complexo está em franca construção. Em sua base funcionará um shopping ligado ao terminal de Calatrava, onde o corretor Gui Tepedino conta que o preço — US$ 500 (R$ 1.500) o pé quadrado (0,09 metro quadrado) — “é o mesmo de imóvel top na Quinta Avenida”.

— Os escritórios, alugados por entre US$ 69 e US$ 75 o pé quadrado, também custam o mesmo que em Midtown. Por isso eles estão tendo uma certa dificuldade — reconhece o brasileiro Tepedino. — Mas está todo mundo investindo ali. Antes do atentado era uma boa área comercial, e depois virou um lugar muito pacato, não tinha nada ali. Mas o turismo atraiu os grandes varejistas e agora tem toda essa movimentação. Este é um grande momento.